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quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Texto: “A hora e a vez de Augusto Matraga – Guimarães Rosa

   Toda a inventividade e maestria de Guimarães Rosa — com neologismos, derivações, onomatopeias e personificações — aparecem na magnífica descrição do amanhecer no sertão de Minas, repleto de maitacas, periquitos e tuins. Uma celebração da beleza da natureza e da força da linguagem.

A hora e a vez de Augusto Matraga (trecho)

"Mas, afinal, as chuvas cessaram, e deu uma manhã em que Nhô Augusto saiu para o terreiro e desconheceu o mundo: um sol, talqualzinho a bola de enxofre do fundo do pote, marinhava céu acima, num azul de água sem praias com luz jogada de um para o outro lado, e um desperdício de verdes cá embaixo — a manhã mais bonita que ele já pudera ver.
Estava capinando, na beira do rego.
De repente, na altura, a manhã gargalhou: um bando de maitacas passava, tinindo guizos, partindo vi­dros, estralejando de rir. E outro. Mais outro. E ainda outro, mais bai­xo, com as maitacas verdinhas, grulhantes, incapazes de acertarem, as vozes na disciplina de um coro.
Depois, um grupo verde-azulado, mais sóbrio de gritos e em fileiras mais juntas.
— Uai! Até as maracanãs!
E mais maitacas. E outra vez as maracanãs fanhosas. E não se acabavam mais. Quase sem folga: era uma revoada estrilando bem por cima da gente, e outra brotando ao norte, como pontozinho preto, e outra ― grão de verdura — se sumindo no sul.
— Levou o diabo, que eu nunca pensei que tinha tantos!
E agora os periquitos, os periquitos de guinchos timpânicos, uma esquadrilha sobrevoando outra ... E mesmo, de vez em quando, discutindo, brigando, um casal de papagaios ciumentos. Todos tinham muita pressa: os únicos que interromperam, por momentos, a viagem, foram os alegres tuins, os minúsculos de cabecinha amarela, que não levam nada a sério, e que choveram nos pés de mamão e fizeram recreio, aos pares, sem sustar o alarido — rrr!-rrri!! rrr!-rrri!! ...
Mas o que não se interrompia era o trânsito das gárrulas maitacas. Um bando grazinava alto, risonho, para o que ia na frente:
— Me espera! Me espera!... — E o grito tremia e ficava nos ares, para o outro escalão, que avançava lá atrás.
— Virgem! Estão todas assanha­das, pensando que já tem milho nas roças... Mas, também, como é que podia haver um de-manhã mesmo bonito, sem as maitacas?!...
O sol ia subindo, por cima do voo verde das aves itinerantes. Do outro lado da cerca, passou uma rapariga. Bonita! Todas as mulheres eram boni­tas. Todo anjo do céu devia de ser mulher."

(Guimarães Rosa, in “A hora e a vez de Augusto Matraga”)
"A palavra escrita no muro" - Lêdo Ivo
“Receita de Ano Novo” – Carlos Drummond deAndrade



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